Estive a ver o registo do blog e cheguei à triste conclusão que já passou um ano desde a última vez que vos falei das minhas leituras.
Que tristeza!
Só uma coisa me consola… a preguiça que me assola não é de LER, apenas de vos escrever.
Desculpem…
Vamos lá então… o que é que eu li no último ano:
Na categoria thriller li “A Rapariga de Antes”, de JP Delaney e “A Paciente Silenciosa”, Alex Michaelides, e o “Rainha Vermelha”, de Juan Gómez-Jurado. Gostei dos três, mas se tivesse que dar 5* a algum, seriam todas para A Paciente Silenciosa.
Também li “Olive Kitteridge”, de Elizabeth Strout, e “O que Contamos ao Vento”, de Laura Imai Messina. Adorei a forma como a Elizabeth constroi as suas personagens, mas confesso que gostei mais do livro da Laura. Um livro que me tocou muito. É sobre o luto e a forma como cada pessoa encontra a sua forma de fazer as pazes com a vida e seguir em frente. A ideia da cabine telefónica no meio do jardim, onde qualquer pessoa pode entrar, pegar no auscultador e “falar” com quem partiu, dizer tudo o que ficou por dizer…
A história do mundo dos nossos jovens, criados nos dormitórios das grandes cidades, o trabalho instável, os sonhos de fama instantânea e vidas iguais ao que se vê nas redes sociais, em contradição com as dificuldades do dia a dia, ter uma casa condigna, construir uma família… tudo contado de forma “sublime” (para não dizer “deliciosa”!). Já ando à procura de mais livros deste Ricardo Adolfo.
“Lá, onde o vento chora”, de Delia Owens. Não consigo explicar porquê, mas tive muito medo de ler este livro. A história de uma criança abandonada por todos com apenas 6 anos, no meio de um ambiente hostil… tive medo de me impressionar, mas todos diziam que era um livro tão bonito…
Quando entro numa livraria fujo a sete pés dos livros com capas muito embonecadas (aquelas letras muito entrelaçadas, com a cara de uma pequena qualquer, os títulos muito redodinhos, já sei que sai uma daquelas história de amor peganhento… blhéc!). Este livro enganou-me, não tem as letras entrelaçadas na capa, mas é uma história de amor, ou melhor é uma história sobre o amor, sobre a capacidade de continuar a amar, mesmo depois de sofrer tanto abandono, solidão, preconceito. É daqueles livros em que sentimos os cheiros e as cores e que fica connosco muitos dias depois de fecharmos a contracapa.
De tal forma que demorei a “pegar” no livro seguinte. “Rapariga, Mulher, Outra”, de Bernardine Evaristo, e logo a seguir “A Outra Metade”, de Brit Bennett. Mais dois livros sobre um dos temas que mais gosto de explorar, o feminismo, mais uma vez o feminismo (e o racismo) pelo olhar das mulheres negras.
Para terminar e como não podia deixar de ser o meu menino também esteve presente… quem é o meu menino?
O João nunca desilude. Gostei especialmente do “Felicidade”, pela originalidade da história e a capacidade deste rapaz para nos conseguir sempre surpreender no final. Do “Águas Passadas”… gostei, mas acho que faltou ali mais… perigo, mais corrida…
Feitas as contas (11 livros), acho que não me portei mal neste último ano, dá quase um livro por mês.
Estou agora a olhar para a minha estante.
Só tenho mais um livro por ler e lá para o fim de agosto tenho duas semanas de férias… têm alguma recomendação?
Já há muito tempo que não vos falava das minhas leituras.
Durante o confinamento adotei a rotina de desligar a televisão no fim do telejornal e ficar a ler algum tempo antes de dormir. Consegui despachar todos os livros que tinha em casa ‘à espera de melhores dias’.
Acabei os dois calhamaços da trilogia Langani (já tinha lido o Irmãs de Sangue, agora terminei com o Fogo Eterno e o Luz Efémera). É uma daquelas histórias épicas que se lê muito bem. Gostei muito do ‘A noite em que o verão acabou’, do João Tordo, e do ‘Os otimistas’, de Rebecca Makkai, acho que foram mesmo os meus preferidos durante o confinamento. Ainda deu tempo para ler o ‘Britt-Marie esteve aqui’, do Fredrik Backman.
Há uns dias terminei o melhor livro que li nos últimos tempos. É um daqueles livros cujas personagens se agarram a nós durante muito tempo depois de fecharmos a última página.
Terra Americana, de Jeanine Cummins, conta a história da Lydia e do seu filho Luca (8 anos) e a forma como se tornaram migrantes para sobreviver.
Andei pelo Goodreads a ler criticas. Parece que lá pelas Americas está tudo em polvorosa. Novamente a questão do racismo… uma americana branca a escrever e, ainda por cima, a ganhar muito dinheiro, com a história dos latinos.
Não sei se é mesmo assim. Não tenho opinião. Sei que é uma história (parece que vai dar em filme… ou não estivéssemos na América!), bem contada e que nos deixa a pensar em todas as Lydias e Lucas que andam pelo mundo atrás de um sonho.
O que leva uma mãe, dona de um pequeno negócio em Acapulco, de um dia para o outro, meter uma mochila às costas e percorrer mais de 2000 Km com o filho pela mão, saltando para os tejadilhos de comboios em andamento (La Besta)?
Há uns tempos falei-vos de outro livro sobre o drama dos migrantes (o ‘Passagem para o Ocidente’), nesse livro sabemos dos medos, das incertezas, das dificuldades por que passam os migrantes, mas somos poupados à violência. No Terra Americana não há floreados. A violência está lá… descrita ao pormenor, em cada página. A violência sobre os mais vulneráveis: mulheres e crianças.
Mais uma biografia. Mais uma história de uma mulher que nos toca cá fundo. Uma história de violência, negligência, tirania, fanatismo.
Tara Westover cresceu no seio de uma família mórmom que esperava e se preparava para o Fim do Mundo. O pai, fanático religioso, não acreditava no Estado e, por isso, fazia questão de se manter à margem: os filhos nasciam em casa, em partos assistidos por parteiras, não eram registados à nascença, não iam à escola, não tinham assistência médica (todos os males, fosse uma constipação, um osso partido, uma queimadura de 3º grau ou um traumatismo craniano com massa encefálica a escorrer eram tratados em casa, com medicamentos homeopáticos que a mãe se especializou a retirar de plantas medicinais).
Tara e os seus irmãos cresceram numa casa isolada na montanha e desde muito novos foram postos a trabalhar na sucata explorada pelo pai. Assistimos a uma sucessão inenarrável de acidentes graves com estas crianças, porque aquele pai punha-os a executar tarefas impensáveis para um adulto, quanto mais para uma criança, sem tomar as mais básicas medidas de segurança e a mãe fechava os olhos… tudo era a vontade de Deus.
As mulheres deviam obediência cega primeiro aos pais, depois aos maridos, até aos irmãos. Não deviam mostrar os joelhos, as clavículas, muito menos os ombros, sob pena de serem consideradas umas rameiras, galdérias.
Havia provisões por todo o lado para quando o Fim do Mundo chegasse, desde dúzias de frascos de pêssegos em conserva na cave, até um tanque de combustível enterrado no quintal. Só que o Fim do Mundo… não chegou (lembram-se do bug do ano 2000?)… e foi nesse momento que Tara começou a duvidar do mundo que a rodeava.
Uma menina que nunca tinha ido à escola, que em casa tinha uns pais que nem se lembravam exatamente da idade que ela tinha e um irmão extremamente violento que a subjugava a seu belo prazer, debaixo dos olhos parentais, conseguiu fazer a admissão a uma faculdade local e dar inicio a um percurso académico brilhante. Entrou numa sala de aulas pela primeira vez na vida com 17 anos e acabou doutorada pela Universidade de Cambridge.
Só que este percurso teve um preço.
Assistimos à luta interior desta mulher. A diferença de valores do mundo à sua volta, choca de frente com tudo o que lhe foi tão violentamente incutido desde que nasceu.
Ter uma educação formal significava abdicar da sua família, cortar as suas raízes.
Foi um preço que pagou e do qual não se arrepende.
Este livro é mais um daqueles livros que vai ficar para sempre na minha estante.
Surpreendeu-me porque é uma história de amor. À partida eu fujo de histórias de amor, mas o livro foi finalista do Man Booker Prize 2017, pelo que não podia ser uma simples história de amor, por isso arrisquei… e ainda bem!
Conta-nos a história de Nadia e Saeed. Dois jovens, num país que vai mergulhando no caos. Nunca sabemos de que país se trata, pode ser o Iraque, a Síria, o Afeganistão… só sabemos que se trata de um país muçulmano, porque Nadia, ao longo de toda a história, insiste em manter a sua túnica preta vestida, sempre que está em locais públicos. Dois jovens apaixonados que depois de todos os esforços de adaptação às constantes mutações no seu país, resolvem partir... sem rumo, sem destino…
São refugiados de guerra… migrantes.
O autor optou por não conduzir o leitor por descrições épicas de travessias imensas e dos perigos associados. Já todos nós estamos suficientemente intoxicados pelas imagens na televisão de colunas de pessoas a caminhar sem destino, de barcos cheios de gente em fuga, em condições tão perigosas. Em vez disso, o autor substitui estas travessias por portas mágicas, que, uma vez transpostas, levam estes jovens do seu país para sucessivos campos de refugiados, primeiro em Mykonos, depois em Londres e, finalmente, em S. Francisco.
Li vários textos de análise a este livro. Quase todos falam numa frase que aparece quase no fim ‘todos somos migrantes através do tempo’. Não foi esta a frase que mais me tocou, foi uma outra, na página 86, que me ficou cravada na memória e que me pôs a pensar estes dias:
“… quando migramos, assassinamos das nossas vidas aqueles que deixamos para trás.”
Já se devem ter perguntado, eu já dei comigo a perguntar-me: como é possível as pessoas optarem por migrar? Sair, assim, sem destino? Como é possível colocar filhos em barcos sobrelotados e lançarem-se ao mar? Será que não amam os filhos?
Amam. É porque os amam que o fazem. São pessoas que foram perdendo tudo, num processo de adaptação contínua… a comida começa a escassear, começam a ver amigos, vizinhos simplesmente a desaparecer (morreram, fugiram?), um dia deixam de ter trabalho (e é normal sair do local de trabalho com computadores, impressoras e televisões às costas), o café de todos os dias que fecha as portas, depois deixa de haver água ou luz, passam a cozinhar em fogões de campismo, depois são as janelas de casa que passam a ser um perigo, porque há balas perdidas e desarrumam-se os móveis de forma a tapar as janelas, depois a guerra entra pelo bairro dentro…
São pessoas, para quem o seu país deixou de ter significado… uma identidade… deixa de haver normas, regras, deixam de ter pontos de referência, sejam eles físicos, sociais, culturais… e, por isso, só lhes resta partir. Partem os mais novos, os mais fortes, os que ainda podem lutar por um futuro melhor para os filhos… ficam os velhos, os doentes, os feridos. Partem com a certeza de não mais ver os que ficam!
O autor não nos entope em análises políticas, religiosas ou económicas… apenas nos fala de esperança. Mostra-nos o ponto de vista do refugiado de guerra, completamente desenraizado, desorientado, sem nada de seu, muitas vezes sem conseguir comunicar, que aprendeu a temer a autoridade (pelas coisas que viu no seu país) e que apenas pede para ser aceite em cada novo sítio onde chega, numa esperança inabalável de conseguir uma vida melhor.
É a esperança que move estas pessoas na busca por uma vida com trabalho, uma casa, mandar os filhos à escola… mas, sobretudo, e é aqui que estes migrantes são diferentes dos nossos emigrantes... buscam uma vida com paz.
Nunca fui pessoa dada a ler biografias. Nunca me interessaram, mas, não sei bem porquê, um dia numa livraria peguei no livro da Michelle e fiquei presa. Todos nós sabemos que a Michelle não foi uma primeira dama dos Estados Unidos como as outras. Não que as outras tenham sido más (não vamos falar da atual…), menos interventivas ou tenham feito pouco, mas a Michelle catapultou essa posição para um outro nível nunca antes visto.
Ofereceram-me o livro como prenda de anos, em dezembro. Comecei logo a ler. Vocês sabem que eu só leio nos transportes públicos, nos dias em que não estou atacada pela mosca do sono. A leitura ia num bom ritmo, o que me surpreendeu, ainda pensei ‘acho que vou bater o meu record’… faltavam umas cinquenta ou sessenta páginas para acabar quando o meu gato ficou doente… andei três semanas muito à toa, não conseguia pensar em leituras e lá se foi a boa média à vida.
O livro retrata na perfeição a imagem que temos dos Obama. Simples, direto, despretensioso, conta-nos o percurso da vida da Michelle desde a infância até à atualidade. O bairro pobre onde cresceu, os pais que se privaram de tudo para que os filhos tivessem a melhor educação possível, o seu percurso escolar. Tinha a ideia que ambos os Obama tinham sido alunos excelentes e, por isso, tinham estudado com bolsas (como tantas vezes vemos nos filmes americanos… os bons alunos têm sempre bolsas), mas não… apesar de terem uma inteligência acima da média, ambos tiveram que contrair empréstimos para pagar os seus estudos. Ambos começaram a sua vida adulta com a responsabilidade de ter que pagar os empréstimos que tinham contraído para estudar.
Com simplicidade e algum humor, Michelle desmistifica o dia-a-dia na Casa Branca. Conta-nos factos banais como quando viu pela primeira vez o cortejo presidencial a aproximar-se... ’não tem um carro de palhaços!’, ou quando conta, por exemplo, que se alguém na Casa Branca quiser ir à varanda (aquela varanda enorme que se vê em todas as fotos), primeiro tem que se avisar os serviços secretos, para que possam desimpedir a rua em frente à varanda… mas, acima de tudo fala-nos na sua posição de Primeira Dama que não chega a ser um cargo, não é um emprego e não tem funções definidas mas que usou como plataforma para uma influência positiva, promovendo alterações significativas na vida de todos os dias do povo americano, com projetos na área da alimentação saudável, da promoção do exercício físico, do combate ao abandono escolar, da melhoria da vida das familias dos soldados, tendo sempre o cuidado de não se misturar em questões políticas, mas intervindo junto da sociedade civil.
Eu sou muito picuinhas com os meus livros. Não gosto de ter capas dobradas ou pontas amarrotadas, mas este livro está cheio de frases inspiradoras, frases que me fizeram voltar atrás para ler outra vez. Não me consigo a imaginar a riscar um livro, por isso, pela primeira vez na vida, dei comigo a dobrar os cantos das páginas para de alguma forma marcar o local de uma frase que me tocou.
O epílogo levou-me às lágrimas (eu sei, sou muito mariquinhas…). A Michelle faz um balanço do que ela e o marido conseguiram alcançar nos oito anos que estiveram na Casa Branca, no que acredita que o povo americano É na sua essência… e da frustração de olhar para o trabalho do sucessor e ver tanto absurdo, tanto disparate, o estatuto da presidência ridicularizado diariamente.