Rita, a madrasta
Isto de ser madrasta tem muito que se lhe diga. Cada caso é um caso, com muitas variáveis em jogo: a madrasta, a criança, os pais da criança, os avós da criança. Tenho a sorte de ter um enteado que sempre foi um amor de menino. Meiguinho. Desde que fosse bem tratado, para ele estava tudo bem (acho que é isto que qualquer criança de 6 anos quer).
Lembro-me de a minha mãe me dizer ‘Oh Rita tens que ter muita atenção. Não estás a casar só com um homem, também estás a casar com o filho dele’ e a minha avó que me disse ‘nunca te esqueças, o menino não tem culpa de nada, ele não pediu para nascer.’
Desde muito cedo o Paulo deixou-nos entregues um ao outro. A intenção era clara. Nós dois tínhamos que nos entender, criar as nossas regras. Ele só intervinha quando era mesmo necessário. É verdade que nem sempre conseguia ser imparcial (era o menino dele), mas houve muitas situações em que compreendeu a minha posição e contrariou o Melga.
Desde o início deixámos muito claro para o Melga que, em nossa casa, o Paulo era o Pai, o Melga era o Filho e eu era a ‘Mãe’. Houve algumas rotinas que quis mudar e tive que batalhar para as conseguir mudar. Nem sempre foi fácil, ainda ouvi algumas vezes a famosa frase ‘se ele fosse teu filho, não fazias isso’. Mas tenho a consciência tranquila. No meu relacionamento com o Melga tive sempre o cuidado de pensar ‘se ele fosse mesmo meu filho, como é que eu fazia’.
Acho que tive bons resultados. Quando havia TPC’s era para mim que o Melga se virava. Estava fora de questão ser o pai a cortar-lhe as unhas. Quando chegámos àquela fase em que já tomava banho sozinho, mas ainda era preciso ajuda para se limpar, era por mim que chamava a cantarolar ‘Ritita, a minha toalhita’.
Lembro-me de um dia estar a esfregar-lhe a cabeça durante o banho e termos esta conversa:
Melga: Sabes Rita, hoje a professora disse que os pais devem ajudar os filhos a fazer os trabalhos de casa.
Eu: Tem toda a razão. Assim os pais ficam a saber que matérias é que os filhos estão a estudar.
Melga: Tu também me ajudas a fazer os trabalhos de casa.
Eu: Pois! Quando estás cá em casa, ajudo.
Melga: Mas tu não és a minha mãe.
Eu: Pois não.
Ficámos um bocadinho em silêncio. Percebi que estava num dilema e não sabia como dar a volta ao assunto.
De repente levanta cabeça, olha para mim e disse: És quase minha mãe.