Era hoje, Paulo...
Lembram-se da verdadeira odisseia que foi o processo de compra da minha casa?
Pois bem, no dia em que finalmente fizemos a escritura, eu e o meu Paulo resolvemos assinalar a data com um jantar a dois, num restaurante perto de casa.
Quando o meu Paulo estava a fazer o pedido, para minha surpresa, oiço-o dizer: 'traga uma garrafa de espumante destas, por favor...'.
Arregalei os olhos ao que ele comentou:
'Não fiques com essa cara... acho que depois desta novela merecemos festejar!'
Estávamos tão felizes, nesse dia.
Tinhamos tantos planos...
Depois as coisas ficaram um bocadinho feias. Foi o tempo em que as taxas de juros dispararam como foguetes. Em pouco mais de dois anos já estávamos a pagar mais 300€/mês, acima da prestação inicial. Foi duro! Durante todo o processo de compra estivemos sempre convencidos que não estavamos a dar um passo maior que a perna, mas aqueles tempos deixaram-nos com medo. Nunca corremos o risco de perder a casa, mas a coisa complicou-se... muito.
Com o tempo as coisas lá viraram a nosso favor. De um dia para o outro, diga-se... por razões que só mentes brilhantes entendem, como é costume dizer-se ‘é a economia, estúpido!’ As prestações foram sempre pagas a tempo e horas e, através do netbanco, íamos vendo o montante do capital em dívida a descer, migalhinha a migalhinha.
...
Um dia, a caminho de casa, disse-lhe:
- Quando o montante do capital em dívida ficar abaixo de ……€, fazemos outra vez um jantar a dois, com direito a garrafa de espumante e tudo.
Disse-o um pouco da boca para fora, como dizia tantas outras coisas, mas o meu Paulo nunca mais se esqueceu e não me deixou esquecer... de vez em quando perguntava-me ‘então morzinho, ainda falta muito?’ ao que eu respondia 'ai homem, não nos doa a cabeça... ainda falta... ainda falta'
…
Nestes três anos e meio em que o meu Paulo já não está comigo (pelo menos fisicamente), principalmente nestes últimos meses, sempre que vou ao netbanco, fazer um pagamento ou uma transferência, de forma involuntária dou comigo a olhar para aquele quadradinho do 'montante do capital em dívida', tenho estado a antecipar este dia...
...
Já não falta nada, Paulo…
O nosso jantar a dois, 'com direito a garrafa de espumante e tudo', era hoje.
(Sim, eu sei que podia abrir uma garrafa de espumante na mesma... mas nunca seria a mesma coisa... agora já não faz muito sentido...)