A propósito desta notícia
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Na minha família apenas tivemos um caso de morte por cancro. O marido de uma das irmãs da minha mãe. Quando foi diagnosticado já era tarde demais. Morreu em 5 meses.
O cancro é uma doença horrível, mortífera, mas, graças aos constantes avanços da medicina, já não são assim tão raros os casos de pessoas que lutaram, conseguiram sobreviver e ficam em condições de fazer uma vida normal, ou muito próximo do normal.
Não estou aqui para atacar esta petição. Quem sou para o fazer. Mas a notícia fala em 'sobreviventes' e não em 'doentes' de cancro. Penso, então, que estamos a falar de pessoas que conseguiram 'matar o bicho' e estão em condições de fazer uma vida normal ou próximo do normal, não é?
Estou aqui para falar dos outros.
Os outros que não têm, nem nunca tiveram cancro, mas que sofrem todos os dias com doenças crónicas incapacitantes.
Os outros como o meu Paulo que viveu, desde os 20 e poucos anos, com a espondilite anquilosante, doença reumática que provoca dores no corpo 24 horas/dia e para a qual os médicos receitam anti-inflamatórios e recomendam nadar em piscina de água quente. As doenças reumáticas não são mortíferas como o cancro, mas são incapacitantes e esgotantes, física e mentalmente. Martirizam o doente e a família do doente. Estão sempre ali, presentes, a condicionar a vida de todos os interagem com o doente. E é para sempre.
O meu Paulo nunca faltava ao trabalho, no máximo chegava um pouco mais tarde, mas só nós dois é que sabiamos o que isso representava: um homem na casa dos 30, 40 anos a ter que pedir ajuda à mulher para sair da cama, para se limpar depois do banho, para atar os sapatos, porque as dores são insuportáveis e dobrar-se é um suplício.
Os outros como o marido de uma prima a quem, aos 20 e poucos anos, lhe foi diagnosticado Doença de Parkinson e que nunca mais teve condições para ter trabalho certo, a quem a Seg. Social negou ajuda apenas porque já tinha adquirido uma casa (antes do diagnóstico) e, por isso, é rico (quem é que neste país emprega uma pessoa que não consegue ter controlo sobre os movimentos do corpo?)
Porque é que estes doentes não têm direito a algum tipo de benefício fiscal. Nem o raio de uma tabela de avaliação de incapacidades, específica para doenças crónicas, existe neste país. As avaliações são feitas com a base na tabela criada para as doenças profissionais. Até o direito à isenção de taxas moderadoras no SNS lhes foi retirado.
No fundo, eu concordo com esta petição, mas não apenas para doentes ou sobreviventes de cancro, porque há quem tenha que fazer uma vida inteira com doenças bem mais massacrantes e debilitantes do que o cancro, para as quais a medicina não dá respostas capazes de aliviar a dor e o sofrimento.